O gênero sci-fi se destaca por explorar conceitos desafiadores e intelectuais que outros filmes evitam, como viagem no tempo, inteligência artificial e a natureza da consciência. Essa complexidade narrativa faz com que muitos filmes de ficção científica exijam mais de uma visualização para serem plenamente apreciados.


Filmes como 12 Monkeys e Blade Runner são exemplos de obras que recompensam o espectador em cada nova maratona. Em 2001, no entanto, um sci-fi de alto perfil estrelado por grandes nomes do cinema foi lançado com recepção morna. A dificuldade em compreender sua trama logo de início, que só se revela completamente após a terceira exibição, foi um dos principais fatores para essa indiferença crítica.
Vanilla Sky: Uma trama que desafia na primeira e segunda vezes
Protagonizado por Tom Cruise, Penélope Cruz e Cameron Diaz, e dirigido pelo premiado Cameron Crowe, Vanilla Sky era uma adaptação de um filme espanhol de sucesso. Apesar do potencial, o longa alcançou apenas 41% no Rotten Tomatoes, com críticas frequentes apontando uma trama indecifrável.

Vanilla Sky é sutil ao apresentar seus elementos e ainda mais reservado ao explicá-los. À primeira vista, pode parecer mais um filme focado na atmosfera do que em uma narrativa coesa.
A primeira visualização de Vanilla Sky pode ser a mais desafiadora. Elementos como a presença de Tom Cruise usando uma máscara e a atuação de Cameron Diaz podem distrair o espectador. O filme se mostra impenetrável como romance, sem sentido como drama e sem direção clara como ficção científica, alternando entre sequências oníricas.
Na segunda exibição, a experiência melhora. Torna-se mais fácil distinguir as cenas reais das que ocorrem na mente de Tom Cruise, permitindo uma maior apreciação da história. A necessidade de torcer para que os personagens de Cruise e Cruz fiquem juntos se torna menos relevante. Essa é uma característica intencional do filme, que busca desviar a atenção para a relação mais crucial: a que existe entre o personagem de Cruise, David Ames, e sua própria mente.
Nesta segunda visualização, os verdadeiros temas de Vanilla Sky — percepção, realidade e vaidade — emergem com mais força. A jornada de David Ames se configura como uma exploração intrigante do sonho lúcido e do poder do subconsciente.
A terceira visualização revela o gênio de Vanilla Sky
É na terceira vez que Vanilla Sky realmente se revela. Após duas exibições consideradas apenas ‘razoáveis’, o espectador já possui uma ideia geral do rumo da narrativa e dos temas centrais, o que enriquece significativamente a experiência.

Com esse conhecimento prévio, Vanilla Sky se transforma em uma obra-prima. Os personagens ganham vida de maneira mais profunda. Enquanto a primeira exibição focava em captar a ‘sensação’ geral, e a segunda em entender os alicerces da trama, a terceira permite ao espectador desenvolver empatia pelos personagens, mergulhar em suas psiques complexas sem esperar respostas fáceis e refletir essas questões para si.
Mais importante, Vanilla Sky expõe sua filosofia sobre a vida e a contentamento. Nas primeiras exibições, é fácil se prender ao ato final de David Ames: dar um salto para encerrar seu sonho e, idealmente, retornar à realidade. Contudo, a decisão de Ames não é o ponto principal. O verdadeiro poder de Vanilla Sky reside em convidar o espectador a fazer sua própria escolha em um momento crucial.
Caso o espectador concorde com o personagem de Cruise de que uma realidade imperfeita é preferível a um sonho perfeito, ele sairá do filme com um renovado senso de afirmação sobre seu próprio futuro. É um sonho imperfeito que leva David Ames a esse lugar, e essa noção de ‘sonho imperfeito’ encapsula precisamente o que Vanilla Sky representa: uma jornada que conduz o espectador à aceitação de sua própria realidade.
Vanilla Sky é um reconhecimento da confusão da vida, uma mensagem de esperança que não ignora o quão assustadora a existência pode ser. É um filme que apresenta Tom Cruise com uma máscara sem rosto, pois seu personagem é, na verdade, uma tela em branco para o espectador se projetar. Todas essas camadas, porém, só se desvendam quando se vivencia o pesadelo de David Ames pela terceira vez.

Fonte: ScreenRant