Ver Rogue One após a jornada intensa de Andor é, sem dúvida, uma experiência singular. O filme se solidifica como um epílogo grandioso para as complexas tramas de rebelião e espionagem tecidas pela série. Contudo, essa transição não ocorre sem nuances: Cassian, o protagonista de Andor, assume uma posição mais coadjuvante, e o tom radicalmente sério da TV é mitigado por elementos mais tradicionais dos filmes de Star Wars – humor, aventura e o famigerado fan service.
Mas calma, não interprete isso como uma crítica negativa. Longe disso. É apenas uma observação sobre como Rogue One se consolida como um filme de transição, uma ponte que transporta o estilo maduro e complexo de Andor para o heroísmo arquetípico da trilogia clássica. Quando vemos os rebeldes, no clímax, passando os planos da Estrela da Morte de mão em mão até a Princesa Leia, a cena, já carregada de emoção e desespero, ganha uma camada extra de significado. Ela simboliza a mudança de tom: a sujeira e o sangue dos mártires moralmente atormentados de Andor, incluindo Cassian, são purificados para dar lugar à figura imaculada da Princesa Leia, vestida de branco, personificando o Star Wars clássico do bem contra o mal.

Adoro essa transição fluida. A trilha sonora de Michael Giacchino, que homenageia John Williams ao mesmo tempo em que imprime sua assinatura, com temas e texturas que remetem a Lost, Missão Impossível 3 e Jurassic World, já antecipa essa mudança. Gosto também que Cassian não monopolize os holofotes, compartilhando o espaço com outros rebeldes cruciais para o sucesso da missão, como Chirrut, Baze e o hilário K-2SO, que surge no final de Andor e aqui rouba a cena.
É interessante notar que esses personagens não são desenvolvidos no sentido tradicional. Há uma dinâmica envolvente, mas nunca se prioriza um retrato individual, como se fossem heróis escolhidos pelo destino ou pela Força. Pelo contrário, há um forte senso coletivo da missão, como se a guerra não deixasse espaço para o desenvolvimento pessoal dos soldados. Em Rogue One, o verdadeiro personagem em desenvolvimento é o objetivo de roubar e transmitir os planos da Estrela da Morte.

Ainda assim, o filme não se recusa a mostrar transformações básicas nos personagens principais. Jyn Erso, por exemplo, tem um arco claro, evoluindo de alguém que tolerava a opressão imperial (desde que não a afetasse diretamente) para uma figura que acredita na necessidade urgente de destruir a superarma. Embora essa transição seja rápida e mais impulsionada por um gatilho pessoal – a relação com o pai – do que por uma transformação ideológica, ela funciona devido ao senso de urgência que permeia o filme e, novamente, porque o individualismo é secundário. Não importa o motivo de Jyn, importa que ela faça sua parte, e que suas ações impulsionem a Aliança para que outros heróis continuem a luta.
Cassian também tem seu arco. Ele faz as pazes com a culpa acumulada por tantas mortes que causou em nome da rebelião. O Cassian de Rogue One está bem integrado à Aliança, como vimos no final de Andor, mas ainda capaz de questionar ordens, hesitar em atirar no pai de Jyn e ignorar a indecisão do conselho para liderar a missão em Scarif com Jyn. Embora eu desejasse mais cenas de Cassian que aprofundassem seu desenvolvimento, é coerente que ele permaneça em uma posição de apoio no filme, honrando a coletividade invisível que viabiliza a luta visível dos Episódios IV, V e VI.

Os arcos de Chirrut e Baze também são notáveis, com Baze, inicialmente descrente na Força, seguindo o exemplo do amigo e se sacrificando após recuperar sua fé, em um tom religioso fascinante, especialmente porque Chirrut não é um Jedi, mas um devoto, dialogando com a noção de uma Força que permeia todos os seres da galáxia, não apenas Jedi ou Sith. K-2SO e Jyn também desenvolvem uma bela confiança mútua. São pequenos detalhes de personalidade e transformação que funcionam neste filme que celebra a ideia de que o todo é maior do que as partes.
Outro elemento que ganha nova perspectiva após Andor é Orson Krennic, interpretado por Ben Mendelsohn. O contraste entre o Krennic de Rogue One e o da série de TV é marcante. No filme, ele é frequentemente subjugado pelos superiores, tendo o controle da Estrela da Morte roubado por Tarkin ou suas vias aéreas ameaçadas por Darth Vader. Em Andor, Krennic surge imponente, assustador, empoderado, sendo a figura mais alta na hierarquia imperial que vemos.
A estranheza do CGI de Tarkin e a ética de reviver um ator falecido como Peter Cushing ainda me incomodam. Mas, ignorando isso, gosto de como ele é usado aqui. Sua impassibilidade tranquila e postura controlada criam um senso interessante da diferença entre os imperiais que já consolidaram sua posição e aqueles que ainda precisam provar resultados, lidar com problemas e preservar sua imagem, sempre com a sutil consciência de que sua sobrevivência depende de uma performance impecável. É o caso de Krennic, que Ben Mendelsohn vive de forma deliciosamente irritadiça, ansioso, impaciente e cada vez mais atento ao quão as coisas fogem do seu controle, o que para ele é aterrorizante. Tudo culmina em sua morte poética e irônica, atingido pelo raio da arma à qual dedicou tanto de sua vida.

Preciso comentar a direção de Gareth Edwards, um cineasta que, apesar de admirado por muitos, considero irregular. Ele sempre imprime um forte senso de escala e realismo tangível aos seus projetos, seja no monumental Godzilla de 2014 ou na excelente integração de efeitos visuais, práticos e filmagem em locação de A Criação. Contudo, nunca consigo me conectar ao drama de suas histórias, pois o considero incapaz de trabalhar o elemento humano. Mas em Rogue One, o elemento humano serve à causa rebelde, aliviando minha necessidade de conexão individual e permitindo que o filme brilhe no que Edwards faz de melhor.
No que tange ao senso de escala, a Estrela da Morte nunca foi tão bem retratada, surgindo ameaçadora no horizonte, eclipsando o sol e causando destruições devastadoras, pois o filme testemunha seu poder do ponto de vista de personagens no chão, vendo a explosão inevitável se aproximar. Os paralelos com a bomba atômica são inegáveis, e gosto de como Mendelsohn faz uma subversão de Oppenheimer, sendo um cientista forçado a criar a arma, e sua única forma de revidar é inserindo uma falha oculta. É uma maneira inteligente de resolver o problema de como o Império construiria algo tão poderoso que pudesse ser destruído com um único tiro. Rogue One pega essa pequena lacuna do filme original e a transforma em uma das histórias mais interessantes do cânone.
Não que o filme seja perfeito. O primeiro ato ainda me incomoda um pouco, parecendo corrido demais, saltando de um local para outro sem permanência. Star Wars sempre nos levou em uma jornada, em parte por nos permitir passar um tempo nos planetas antes de seguir viagem. Eu gostaria de ter tido mais minutos em Jedha ou com Jyn na prisão. Tudo parece apressado e cortado na montagem, o que pode ser um reflexo da turbulenta produção nos bastidores. Rogue One foi um prenúncio do caos que dominaria outras produções Star Wars da Disney, como o filme do Han Solo. Mas, considerando isso, é admirável que Rogue One entregue tão pouco dessa confusão nos bastidores, dado o que vemos na tela.

Para mim, o filme começa com alguns tropeços, mas rapidamente encontra seu ritmo e destino final, seguindo em sua direção com crescente êxito. A segunda metade entrega um dos melhores clímax da saga, resultado da união de vários esforços: soldados no chão, naves no espaço, espiões na torre imperial. Essa batalha final é excepcional, com um objetivo definido para cada parte: soldados atraindo stormtroopers, X-Wings fornecendo apoio aéreo, naves em órbita derrubando o escudo para que os planos da Estrela da Morte possam ser enviados, enquanto Krennic enlouquece ao perceber a bola de neve de problemas crescendo.
Há um clima fatalista e trágico nessa missão que nos envolve completamente à medida que cada personagem morre, um por um, sempre contribuindo com uma pequena, mas crucial, parte da missão. Tipo, se um deles falhasse, toda a sequência de eventos que culminam na explosão da Estrela da Morte por Luke simplesmente não aconteceria. Isso é fascinante. O ápice da emoção surge no abraço de Cassian e Jyn, aceitando seu destino e se entregando à morte certa, com a convicção de terem cumprido seu propósito. Apesar de me incomodar que, nos últimos segundos do plano final, Diego Luna abra os olhos e o editor deixe isso na cena – talvez não intencional, mas a única imagem disponível.
Finalmente, após toda essa dimensão de sacrifício rebelde para transmitir essa informação vital para a sobrevivência da rebelião, o filme ainda nos presenteia com a cereja do bolo. E aqui, peço licença para abandonar o crítico e abraçar o fã. O momento em que Vader dizima os rebeldes com a maior facilidade do mundo é, para mim, um dos melhores momentos da saga Star Wars. Ele materializa o que a trilogia clássica apenas sugeriu – seja pelas limitações da época ou pelo roteiro não prever esse tipo de cena – a certeza de quão assustador e implacável Vader pode ser quando necessário. É um desfecho perfeito para um filme que realmente merece esse tipo de cena, e que para mim consolida essa passagem de bastão iniciada em Andor.

Acompanhamos Cassian contra Syril Karn, Luthen contra Dedra, Jyn contra Krennic, subindo a hierarquia de heróis e vilões até chegar em Vader e culminar na Princesa Leia, verbalizando a palavra crucial do título do próximo filme: A Esperança. Com isso, dar play no Guerra nas Estrelas original de 1977 se torna praticamente irresistível.
É seguro dizer que Rogue One é o grande filme da era Disney, pelo menos para mim, e que se tornou ainda melhor e mais impactante depois de acompanhar toda a trajetória de Andor, culminando neste grande clímax trágico de sacrifício que passa o bastão para a trilogia clássica continuar a história que conhecemos há tanto tempo.